OS GRANDES PERSONAGENS DO PROTESTANTISMOZwinglio o Exegeta (1484-1531)
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"O cristão nada mais é que um cidadão fiel e bom e a cidade cristã nada mais é que a Igreja
cristã."
Quando
falamos sobre a Reforma Religiosa e/ou Reforma Protestante que ocorreu no século
XVI, um trio de personagens se sobressai: Lutero, Calvino e Zwinglio.[1]
Entretanto, se os dois primeiros são conhecidos por suas obras teológicas e
exegéticas, Ulrico Zwinglio[2](1484-1531) ficou caracterizado apenas por suas realizações
eclesiásticas e seus esforços políticos para levara adiante o movimento
reformatório nos Cantões Suíço.[3] O seu pensamento teológico e suas obras
exegéticas foram praticamente ignoradas, como se fossem de valor menor do que
seus dois contemporâneos mais vistosos. Todavia, suas contribuições nestas duas
preciosas áreas do conhecimento teológico-exegético foram e continuam sendo de
grande valia para uma compreensão mais ampla do movimento reformado, cujas
ondas sísmicas ainda se fazem sentir nos dias atuais.
Em 1522
inicia seus estudos de hebraico, ainda que reconhecesse as dificuldades
inerentes nesta língua, mas determinou-se a perseverar até que pudesse alcançar
algum sucesso. Neste período teve oportunidade de encontrar o grande professor
de hebraico Andreas Boschenstein, que havia ensinado Melanchthon em Wittenberg
e que elaborara um gramatica da língua hebraica. Juntamente com outros
zuriquenhos, entre os quais Felix Manz, dedicou-se ao aprendizado do idioma que
seria fundamental para seu trabalho exegético e teológico.
Com
dedicação e determinação alcança um nível elevado no conhecimento da língua
hebraica, que juntamente com outros companheiros acadêmicos tornaram possível
empreender uma tradução dos textos bíblicos com o objetivo de oferecer pela
primeira vez uma Bíblia que poderia ser compreendido pelo povo suíço. Sua maior
contribuição neste empreendimento inédito esta na sua tradução dos Salmos,
queapesar de estarem pronto em maio de 1529, somente puderam ser publicados
após a morte de Zwinglio, em 1532. Uma importante e avaliada opinião pode ser
encontrada nas palavras do Professor V. Ryssel a partir do Salmo 23:
“A tradução de Zuinglio do ano 1529 é uma tradução sem
erros, a tradução mais literal possível das expressões hebraicas, que nem
sempre leva em grande consideração as expressões alemãs. O verbo hebraico dá
também, segundo suas condições etimológicas, o mais preciso wieder (de volta)
na frase “er bringt meine Seele wieder” (ele traz de volta minha alma), ao
contrário de “erfrischt” (refrigera) na tradução de 1531 que traz o sentido
segundo a forma alemã. Não é segundo a forma alemã também “in meinem Angesicht”
(em minha face) no versículo 5, que na tradução posterior foi melhorado. Por
outro lado a frase “auf den Pfad der Gerechtigkeit” (na trilha da justiça) no
versículo 3, que se manteve na tradução posterior, não se origina de uma falta
de consideração com as expressões alemãs, já que no versículo 2 não se traduz
“Wasser der Ruhe” (águas da tranquilidade), mas “ruhige bzw. stille Wasser”
(águas tranquilas). Zuínglio no entanto o traduz assim porque ele assume que a
expressão (= em caminhos retos) não pertence mais à imagem, mas – como isto
acontece frequentemente na poesia hebraica – abandona esta imagem e então deve
ser entendida em sentido ético. Deve-se assumir isto também porque em Zuínglio,
mais do que em Lutero, encontra-se o esforço de expressar mais claramente
possível a imagem do pastor. Por isto ele traduz no versículo 2a: “er ernert
(alpet) mich” – na Bíblia de 1531 “er macht mich lüyen” = ele me deixa em paz –
e no versículo 2b: “er treibt mich”, cuja expressão também é usada no versículo
3 (e aqui também pela Bíblia de 1531), onde no entanto se encontra na última
assim como em Lutero, no versículo 2b, o mais neutro “er führt mich”. Uma
tentativa muito bela de interpretar a imagem mais vividamente é apresentada no
versículo 4, onde Zuínglio traduz o verbo do antecedente condicional não pelo
simples “gehen” (ir) ou “wandern” (caminhar), mas é expressa muito incisivamente
pela expressão “sich vergehen” (= sich verlaufen, sich verirren, morrer, se
perder). A tradução de 1531 escolheu a melhor palavra para a imagem no
versículo 4, “Todesschatten” (sombras da morte), no lugar da menos precisa
“Tod” (morte), isto talvez porque também era a primeira vez neste ínterim que
esta expressão mais precisa (que hoje também é livremente indicada) se tornou
conhecida. O relato literal no versículo 5 “mein Trinkgeschirr ist voll” (meu
copo está cheio) seria adaptado para o estilo alemão, na verdade de forma
completamente oportuna, substituído por “und füllest mir meinen Becher” (e
enche meu cálice). (EGLI, 1900, p. 156-157).
Bíblia de Zurique 1531
Impressa por Christoffel Froschauer
Deste modo, aproximadamente três anos antes da publicação da
famosa Bíblia de Wittenberg (1534), a cidade de Zurique já possui uma Bíblia na
linguagem vernácula, em um belíssimo trabalho tipográfico ilustrado em parte
por Holbein.[4]
A partir
de 1525 ele estabelece um curso de Bíblia livre para o clero e estudantes da
escola de latim e o curso acontecia diariamente, exceto as sextas-feiras.[5]
Auxiliado por estudante ou um colega desenvolvia seus comentários sobre os
textos bíblicos, utilizando como ferramentas o texto hebraico e a septuaginta
(versão grega do texto hebraico), o texto grego do Novo Testamento e a tradução
latina da Vulgata (versão oficial da Igreja Romana). Desta maneira ele podia
comparar os diversos textos e esclarecer os equívocos encontrados nas
traduções, justificando sua exegese. Estas aulas públicas de Bíblia receberam
oficialmente, em 1535 o nome de “Propheizei [Profecia]”, mas conforme
informação de Pollet, “estava provavelmente em uso antes dessa data” (1988).
Este termo grego, utilizado por Paulo (I Co. 14.1-3), era utilizado com o
sentido de instruir, exortar e encorajar e desta forma, Zwinglio indica que
suas exegeses dos textos bíblicos estavam debaixo da direção e influência do
Espírito Santo. No período de 1525-1531 ele principia estudos que abrangeram 21
livros do Antigo Testamento, seguindo uma ordem cronológica; nas Sextas-Feiras
estudava-se o Novo Testamento: os Evangelhos, as Epístolas Paulinas e a
Primeira Epístola de João.
Ao optar
por uma predominância dos livros do Antigo Testamento em seus estudos públicos,
bem como em seus tratados teológicos, revelam o propósito que ele perseguia de
submetê-los ao crivo dos ensinos neotestamentários. Para Zwinglio o estudo e a
compreensão da mensagem veterotestamentário deve ser feita à luz de Cristo e
não o inverso; sempre se poderia encontrar no Antigo Testamento o que foi
claramente expresso em Cristo. Desta forma, ele sempre foi resistente a
discutir o Novo Testamento no Antigo, mas não o impediu de utilizar amplamente
os ensinos do Antigo para combater os conceitos formulados pelos anabatistas.
Os
anabatistas entendiam que o batismo deveria ser a resposta consciente e
explicita de uma experiência pessoal de conversão, portanto não aceitavam o
batismo infantil.[6] A argumentação de Zwinglio tomava como princípio o
preceito da circuncisão instituída por Deus em relação aos israelitas; assim
como a circuncisão não era a causa da salvação do israelita, mas se constituía
em um sinal da Aliança, o batismo infantil cristão também se constituía em um
sinal de que o filho(a) do cristão estava inserido(a) na Nova Aliança em que
seus pais foram inseridos mediante a profissão de fé em Cristo. Todavia, para Zwinglio a circuncisão não se
constituía em uma confirmação da fé de Abraão, mas um compromisso de conduzir
seus filhos a Deus dentro dos termos da Aliança anteriormente estabelecida. Ele
assim se expressa: “O nosso batismo tende a mesma coisa que a circuncisão
anteriormente, é o sinal da aliança que Deus fez conosco através de seu Filho”.
(STEPHENS, 1999, p. 263).[7]
Os
anabatistas entendiam que todo o Antigo Testamento havia perdido seu valor
mediante a Nova Aliança estabelecida por meio de Cristo, mas Zwinglio rejeita
esta tese, pois segundo ele esta interpretação dos anabatistas acabava por
rejeitar a Deus, que se revela em ambos os Testamentos.[8] Para fundamentar o
valor do Antigo Testamento ele invoca quatro textos do Novo Testamento: Mt
22.29; João 5.39; Ro.15,4 e 1Cor. 10.11, os quais trazem em comum o apelo ao
Antigo Testamento como fundamento da mensagem cristã. Em 1 Coríntios 10.11 esta
escrito: “Essas coisas aconteceram a eles como exemplos e foram escritas como
advertência para nós, sobre quem tem chegado o fim dos tempos” (NIV),
referindo-se à experiência de Israel no deserto. Segundo ele, conforme seu
“Prefácio aos Profetas”, incluindo também o verso 6 de 1 Coríntios 11, todos os
acontecimentos registrados no Antigo Testamento se revestem de simbolismos e
servem para nosso uso, pois, foram escritos para o nosso benefício. Esta é a
convicção que esta subjacente da leitura que Zwinglio faz de todo o Antigo
Testamento à luz da revelação de Cristo (STEPHENS, 1999, 107).[9]
Sua
convicção de que a Antiga e a Nova Aliança eram basicamente uma, lhe permitiu
usar os textos veterotestamentário em seus debates com os católicos e também
com Lutero, a cerca da Última Ceia, onde ele a coloca em paralelo com a Páscoa
judaica (Êxodo 12.11). Em seus trabalhos exegéticos, as analogias entre a
circuncisão e o batismo, a Páscoa e a Última Ceia emergem com constância, como
realça Stephens: “o método comparativo é um elemento constante nos escritos de
Zwinglio, tanto nos comentários como em outros textos” (1999, p. 92).
É
importante destacar ainda que Zwinglio estava plenamente convencido de que toda
a Bíblia foi escrita para o bem da humanidade. Em sua ênfase do sentido natural
da Escritura ele acaba por destacar o sentido moral e espiritual dos textos
bíblicos. Para ele o sentido moral do texto é a aplicação natural para o
ouvinte, que vai trazer compreensão correta do texto e consolo para a vida
dele. Outra vertente de sua exegese estava na sua preocupação filológica, pois
entendia a necessidade de pregar o texto bíblico em sua expressão autêntica –
por isso gastava tanto tempo em conhecer profundamente a língua hebraica e
grega, em quais os textos bíblicos foram escritos.
Por fim,
se Zwinglio minimizava a utilização da interpretação alegórica, por outro lado
ele utilizou extensivamente a interpretação tipológica. Para ele as figuras de
Noé, Isaque, José, Moisés apontavam para a revelação de Cristo. Evidentemente
que em alguns casos ele torna-se arbitrário em suas intepretações tipológicas,
mas com certeza muitas histórias e personagens do Antigo Testamento encontram
seu significado e relevância na revelação cristológica do Novo Testamento.
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira - Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
ivanpgds@gmail.com
Outro Blog - Reflexão Bíblica
http://reflexaobiblica.spaceblog.com.br
Referencias Bibliográficas
BROTTON, Jerry. Uma história do mundo em doze mapas.
[Tradutor: Pedro Maia Soares]. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
DREHER, M.N. A crise e renovação da igreja no período da
reforma. [ Coleção Histórica da Igreja], v. 3. São Leopoldo: Sinodal, 1996, p.
62-65.
EGLI, Emil. Zwingli
als hebraer. Suiça: Journal Zwingliana, Swiss Reformation Studies Institute,
1900 [1/8]. Disponível em:
http://www.zwingliana.ch/index.php/zwa/article/view/2163/2073. Acesso em
15/09/2014. [Tradução:
http://www.e-cristianismo.com.br/pt/outros-reformadores/256]
LINDBERG, Carter. As Reformas na Europa. São Leopoldo:
Sinodal, 2001. (Capto. 7)
MAINKA, Peter Johann. Huldrych Zwingli (1484-1531), O
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Maringá, 2001.
http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciHumanSocSci/article/viewFile/2758/1893.
RAATH,
A.W.G. e FREITAS, S.A. Calling and resistance - Huldrych Zwingli’s (1484-1531)
political theology and his legacy of resistance to tyranny. South Africa:
Department of Constitutional Law and Jurisprudence University of the Free
State. Disponível em: http://puritanism.online.fr/puritanism/Calling%20and%20Resistance.pdf.
Acessado em 15/09/2014.
STEPHENS,
W. Peter. Zwingli le théologien. [Histoire et Société]. Genève: Labor et Fides,
1999.
POLLET, J.
V. Huldrych Zwingli et le Zwinglianisme. Paris: Vrin, 1988.
FONTE:
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/2013/11/verbete-protestantismo.html
MAIS INFORMAÇÕES
http://www.mackenzie.com.br/7063.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ulrico_Zu%C3%ADnglio
http://exemplosdahistoria.blogspot.com.br/2014/06/ulrico-zuinglio.html
http://bereianos.blogspot.com.br/2013/11/os-67-artigos-de-ulrico-zuinglio-1523.html
http://bloghistoriacritica.blogspot.com.br/2009/11/zuinglio.html
http://www.academia.edu/2419171/As_67_Conclusoes_de_Ulrich_Zwingli
http://www.monergismo.com/textos/biografias/zuinglio-sinopse_helio.pdf
http://www.e-cristianismo.com.br/biografias/257-vida-e-obra-de-ulrico-zuinglio
Muito bom!
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